Calcanhar de Xandão deu a volta ao Mundo Versão para impressão
Sábado, 10 Março 2012 02:32
120310_ojogoDormiu como um bebé

De um momento para o outro, Xandão ficou nas bocas do mundo. O central brasileiro que o Sporting foi buscar ao São Paulo em janeiro - emprestado pelo Desportivo Brasil, clube administrado pela Traffic - marcou o golo do triunfo sobre o Manchester City na Liga Europa, de calcanhar, mas o cometimento quase heroico não mudou as rotinas simples do central. A adrenalina do momento que fez vibrar as bancadas de Alvalade acalmou horas depois e o jogador, que, tal como a sua esposa, viu o telemóvel pessoal ser "invadido" por centenas de mensagens e telefonemas de felicitação e apoio que chegaram de todo o lado, pôde repousar e dormir como um bebé. "Falei com ele, quando estava a sair do balneário no final do jogo. Estava muito feliz! Voltei a falar com ele hoje [ontem] e sei que curtiu à noite e acordou satisfeito com a vida", descreve, a O JOGO, Renato Figueiredo, representante de Xandão.

Além de agente, Renato Figueiredo é também conselheiro e amigo do central, que não se cansa de lhe transmitir a vontade de "fazer história no Sporting", que, para promover a contratação definitiva, terá de desembolsar três milhões de euros até junho de 2013 pela compra do passe. "Xandão adorou logo o clube, o país e a cidade. A esposa também está em Lisboa e está muito feliz. Ele sempre me diz que quer ser ídolo no Sporting, quer marcar a história do clube. 'Vim para ficar!', diz-me constantemente. E acha que já deu um pequeno passo", conta Renato Figueiredo.

Ainda à procura do seu espaço, Xandão beneficiou dos problemas físicos de Rodriguez e da recente lesão de Onyewu para se afirmar na equipa agora orientada por Ricardo Sá Pinto. Dois meses não chegam para entrar na história dos leões, mas a envolvência da partida com o Manchester City, no arranque do apuramento para os quartos de final da Liga Europa, fez o toque artístico do brasileiro ganhar outra transcendência. "E já começou a marcar a história do Sporting, até porque o golo teve repercussão no mundo inteiro. Ligaram de todo o lado a dar os parabéns. Foi Cleiton Xavier, do Metalist, da Ucrânia; Marquinho, do Roma; Danilo, da Udinese, entre muitos outros... Todos viram o golo de Xandão e quiseram parabenizá-lo", relata o agente.

Mas festejar golos não é prática comum em Xandão. Apesar de ter começado a formação como avançado e de só ter recuado para defesa-central por necessidade da equipa, na altura a Escolinha de Futebol Municipal, a torre brasileira raramente viu o seu potencial de finalizador na área nas bolas paradas ser aproveitado. No Guarani, Xandão ainda marcou alguns golos, em divisões secundárias, mas quando chegou ao São Paulo, o treinador Ricardo Gomes - que até gostava dele - não o deixava subir sequer nos cantos. Resultado: em duas épocas inteiras no emblema paulista, Xandão apenas marcou um golo.

YouTube pôs o golaço a correr o mundo

A era da globalização ficou mais uma vez patente no volume de crescimento constante de visualizações do golo de Xandão ao Manchester City. Na maior rede aberta ao público em geral, o YouTube, foram colocadas dezenas de vídeos diferentes com o calcanhar certeiro do central, facto que até evitou a concentração de visualizações num só vídeo. Mesmo assim, pelas 21h30 de ontem, ou seja, pouco mais de 24 horas após o término do jogo de Alvalade contra os citizens, os três vídeos mais vistos somavam 8854, 6036 e 4442 visualizações, e sempre a subir! O golo do central leonino fez furor internacionalmente, sobretudo em Portugal, Inglaterra e no seu Brasil natal (no YouTube, mas também em sítios de informação e blogues), onde muitos ficaram incrédulos com a nota artística do jogador.

Reza na igreja todas as semanas

Xandão é um evangélico devoto que, segundo o seu agente, Renato Figueiredo, "crê bastante em Deus, pede muito e agradece", o que explica a sua forma de festejar o golo contra o City: correu de volta para a sua zona de ação com os braços no ar e os dedos indicadores a apontar para o céu, "agradecendo ao Senhor". Mal chegou a Portugal, uma das preocupações de Xandão foi precisamente encontrar um local de culto para si. E já encontrou uma igreja evangélica que frequenta uma a duas vezes por semana.

Rivaldo avaliou-o antes do calcanhar

Nem de propósito: no dia em que Rivaldo, em entrevista, preenchia as páginas centrais de O JOGO e, no devido espaço, ressaltava as potencialidades do seu ex-colega no São Paulo, Xandão subiu à área do Manchester City para fazer estragos. "Tem um ano e meio para mostrar o que vale no Sporting e acho que se vai dar bem, porque gosta de trabalhar e é dedicado", caracterizou o esquerdino que agora representa o Kabuscorp, em Angola.

Dois Ricardos veem mais golos

Pelo São Paulo, seu ex-clube, Xandão apontou apenas um golo, mas em Portugal, apostam Ricardo Gomes e Ricardo Rocha, a dupla de centrais do Brasil no Mundial'1990, o aproveitamento nas bolas paradas vai mudar-lhe a imagem. "Tem estatura, vai poder marcar muitos golos. No Brasil, teve pouco tempo de equipa grande. Mas no Sporting será diferente", projeta Gomes. "Xandão sabe aparecer, sabe posicionar-se na área contrária. Também vai fazer a diferença nas bolas paradas ofensivas", reforça Ricardo Rocha.

São-paulinos de boca aberta

Direto da maior cidade do Brasil, Thiago Oliveira da Silva, membro da Torcida Independente que apoia o São Paulo, numerosamente, desde 1972, é sarcástico na recordação do central que foi notícia por todo o mundo pelo golo marcado ao Manchester City. "Xandão? Pô, nós aqui estamos habituados a quem saiba jogar à bola", dispara o conhecido adepto são-paulino, que, num tom mais sério, realça: "Ainda há pouco fui à internet e vi o golo que ele fez pelo Sporting. Foi bonito. Aqui, ele não fazia disso. Ele não era muito querido, é verdade. No entanto, era um jogador que, mesmo limitado, era esforçado, dava o que tinha e não improvisava em campo."

Falando com O JOGO a partir da sede da claque, que estava em plenos preparativos para o jogo de amanhã frente à Portuguesa de Desportos, Thiago Oliveira da Silva recorda a partida em que Xandão caiu em desgraça no Morumbi... aos pés de Liedson. Apesar de o agora leão admitir as falhas e reconhecer publicamente que a sua exibição fora um desastre, jamais foi absolvido pelas arquibancadas. "Foi de mais; Liedson fez o que quis dele. Nós fomos a última torcida que o xingou. Tínhamos grandes esperanças nele. Xandão estava a jogar muito bem ao serviço do Grémio Barueri quando foi contratado", sustenta Thiago Oliveira da Silva, que, mesmo assim, destaca as qualidades humanas e o presente do agora leão Xandão: "Parece que ele está dando a volta por cima aí em Lisboa, não é? Ainda bem. Xandão era uma pessoa bacana, isso tem que ser relevado. Nunca foi ídolo aqui, mas tinha bom comportamento."

O grande sonho chama-se escrete

Aquando da sua chegada a Portugal, Xandão declarou que chegar à seleção do Brasil era um dos seus grandes desideratos, chegado que estava a um clube cuja dimensão lhe permitia sonhar com a chamada ao coletivo canarinho, comandado por Mano Menezes, que bem o conhece. À medida que a sua folha de serviço no Sporting vai ganhando novos e importantes registos, o objetivo parece crível a quem lida de perto o defensor e zela pelos seus interesses.

Renato Figueiredo, empresário do camisola 93 da formação lisboeta, acredita que uma eventual chamada ao escrete não está assim tão distante quanto possa parecer a alguns. "Chegar à canarinha? Agora tudo é possível! O Xandão está a jogar num grande clube da Europa, onde está também o Elias que é convocado! Também tem possibilidades", asseverou. O agente fundamenta a sua perspetiva levando ainda em linha de conta a idade do defesa central e a margem de progressão que apresenta, agora que "aquele" calcanhar o elevou a outro nível de notoriedade de leão ao peito. "É preciso observar que o Xandão tem 24 anos, é novo e está muito a fim de representar a seleção do seu país. Acredito que se ele for capaz de continuar a jogar neste ritmo, crescente, ficará com todas as condições para lá chegar."

Polga é principal muleta

Um dos mais antigos jogadores do plantel leonino, no qual ingressou durante o verão de 2003, Anderson Polga está não apenas entre o lote de capitães como assume ainda o papel de principal responsável pela integração de jogadores oriundos do seu país. O internacional brasileiro, campeão do mundo em 2002, tem sido uma grande ajuda para a adaptação de Xandão a um novo país, auxiliando-o na integração na cidade de Lisboa. Além do bom entrosamento que vai ganhando ao lado do camisola 4 verde e branco dentro do retângulo de jogo - ontem bem patenteado -, Xandão já está perfeitamente adaptado à nova realidade que encontrou há cerca de dois meses. Apreciador da gastronomia portuguesa e tranquilo fora dos relvados, Xandão é ainda visita de casa do parceiro de setor.

"o São Paulo já deve saber que errou"

Referência do eixo da defesa leonina nos anos 1990, Marco Aurélio gostou do que viu de Xandão frente ao City e deixou uma palavra ao treinador, que bem conhece. A O JOGO, o homem que chegou a usar a braçadeira de capitão do Sporting revelou que o compatriota está a mostrar o que vale: "Claro que vi o golo! Cá no Brasil vibrou-se e falou-se muito nesse lance, está até nos sítios de internet que não são desportivos. Com tempo, Xandão vai encontrar o seu espaço e vingar. O São Paulo nunca vai dizer que se arrependeu, mas do jeito que está a equipa e com os golos que sofre... sabem que erraram e fizeram um mau negócio. Deixo também uma palavra a Sá Pinto, que conheço bem. Torço fervorosamente pelo seu sucesso!"

In ojogo.pt

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