Oceano Cruz deixou a Selecção Nacional de sub-21 e acusa Gilberto Madaíl de não o ter apoiado. “Nunca foi a um estágio desejar-me boa sorte”, diz, sobre o líder da FPF. O ex-capitão leonino lamenta ainda a pouca consistência exibicional dos verdes-e-brancos.
Correio Sport - Que balanço faz dos quase dois anos à frente da Selecção Nacional de sub-21?
Oceano – Foi positivo, apesar de ter falhado o apuramento para a fase final do Europeu da categoria que se disputa no próximo ano. Foi uma grande experiência e tive grande orgulho em defender a casa que é de todos nós.
- O que falhou no apuramento?
- Admito que podíamos ter feito melhor. Houve jogos em que não fomos eficazes e pagámos caro por isso.
- Se tivesse garantido o apuramento, acha que ainda estaria no cargo?
- Mesmo que me apurasse, sinceramente acho que não continuaria.
- Porquê?
- A partir da saída de Carlos Queiroz as coisas estavam definidas. Quem acreditou em mim foi Carlos Queiroz, a quem estarei eternamente grato. Quando ele saiu senti que estava esvaziada a minha capacidade de decidir.
- Então, porque não saiu com Carlos Queiroz?
- Porque ele me pediu para ficar. Falei na altura com Queiroz e ele foi da opinião de que eu devia ficar até ao fim, até porque nos faltavam dois jogos importantes na qualificação – Inglaterra e Macedónia. Foi por respeito a Queiroz e aos jogadores dos sub-21 que me mantive até ao fim, pois faltava um mês para terminar o meu contrato. No entanto, reconheço que o mais lógico era ter colocado o lugar à disposição quando Queiroz saiu.
- Gilberto Madaíl apoiou-o?
- Nunca senti o apoio de Madaíl. Desde que fui seleccionador, ele nunca foi a um estágio desejar-me sorte, ao contrário do que fez com outros seleccionadores da categoria. Pelo que sei, o presidente ia sempre ao primeiro estágio dos sub-21 desejar boa sorte ao seleccionador e ao grupo. Isso comigo não aconteceu.
- Qual o sentimento em relação a Madaíl?
- Fiquei muito desiludido com Gilberto Madaíl. Sinto que ele nunca acreditou em mim.
- Sentiu-se ultrapassado na escolha que Paulo Bento fez em relação a Rui Jorge para seleccionador dos sub-21?
- Acho que a escolha de Rui Jorge já estava feita mesmo antes da minha saída. O seleccionador terá de trabalhar em articulação com o dos sub-21, que é uma antecâmara da selecção A. É natural que Paulo Bento tivesse escolhido uma pessoa de mais confiança dele.
- Qual será o seu futuro?
- O meu passado é futebol, o presente é futebol, por isso o futuro terá de ser futebol. Tenho tido propostas para continuar como treinador, em Portugal e no estrangeiro, ou para trabalhar na gestão do futebol.
- Ser amigo de Carlos Queiroz pode fechar-lhe portas no futebol português?
- A amizade nunca fecha portas. As coisas não são assim e Queiroz tem um prestígio inabalável.
- Com que opinião ficou do processo de destituição de Queiroz?
- Podia e devia ter acontecido de uma forma menos conturbada. Bastava uma conversa entre ele e Madaíl. Mas acho que ainda há muitas coisas por descobrir neste processo. Quando acabar, saberemos toda a verdade e não apenas uma parte da história. Queiroz tem uma palavra importante, que se vai fazer ouvir com a sua defesa.
- Sonha com o regresso ao Sporting?
- Não é uma questão de sonhar. O Sporting será sempre a minha primeira casa e sinto que o meu futuro, mais tarde ou mais cedo, passará pelo Sporting.
- Chegou a rejeitar ser adjunto. Exige o cargo principal em Alvalade?
- Não, de todo. O que eu gostava era de estar numa posição em que me sentisse útil ao clube. Foi sempre isso que disse aos dirigentes. A única exigência é sentir que o meu trabalho possa representar algo de que o Sporting beneficie.
- Alguma falou no seu regresso com José Bettencourt?
- Não. Nunca.
- Como tem visto a época do Sporting?
- Em termos europeus, muito bem. A nível da Liga, a equipa não tem mantido o mesmo nível.
- O que é que tem faltado?
- Consistência. A equipa já quebrou emocionalmente em alguns momentos. A pouca consistência exibicional do Sporting agrava-se com a grande consistência exibicional do FC Porto.
- O campeonato está entregue?
- Não, não está. O FC Porto tem uma vantagem tremenda, mas desde que os campeonatos têm o sistema de três pontos por vitória, é mais fácil encurtar distâncias.
- Acredita que o Sporting pode ser campeão?
- O pensamento do Sporting deve ser o de ganhar os seus jogos e tentar reduzir diferenças para os da frente.
- Muitos têm criticado a falta de sportinguistas na estrutura do clube. Que opinião tem?
- Há muita gente sportinguista com enorme potencial e que podia ser útil ao clube, casos de Manuel Fernandes, Carlos Xavier e Venâncio, entre outros. As SAD afastaram os sócios do clube e o Sporting não sabe aproveitar as figuras do clube. Temo que o afastamento será ainda maior. O Sporting tem negligenciado figuras que podiam ajudar o clube a ser mais forte.
- O que sugeria que pudesse ser feito para reaproximar os sócios do clube?
- O presidente terá as suas convicções e ideias, mas penso que se devia tentar trazer para dentro do clube pessoas que já jogaram no Sporting. Mas não o fazer por fazer, mas sim pelo que essas pessoas podem captar em termos de mobilização.
- O que tem achado do trabalho de Costinha?
- Tem capital de experiência grande que construiu na carreira como jogador, mas está num cargo novo e ainda a aprender. Pode fazer muitas coisas ao serviço do Sporting. Tudo vai depender dos resultados.
- Uma vez que é treinador, pode ser encarado como uma ameaça a Paulo Sérgio?
- De maneira nenhuma. Tenho saudades do Sporting, é uma casa que me irá marcar para sempre, mas nunca vou desejar o mal de ninguém em proveito próprio. Quando acontecer o meu regresso, e se acontecer, será de forma natural.
- Muito se tem falado da juventude dos capitães do Sporting – primeiro Moutinho e agora Carriço. A braçadeira está banalizada?
- Não. Moutinho fez muitos jogos pelo Sporting e não há que falar mal dele como capitão. O Carriço conheço bem. Treinei-o nos sub-21, tem liderança, é respeitado e representa bem a mística do Sporting. A idade não tem nada a ver com a atribuição de uma braçadeira. Fui capitão e sei que essa condição não tem nada a ver com a escolha de campo antes de um jogo. É preciso raça, entrega e ser capaz de empurrar a equipa para a frente, puxar pelos colegas e dar exemplo. O Carriço reúne esses predicados.
- Moutinho saiu do Sporting para o FC Porto. O Oceano foi tentado a fazer o mesmo?
- Fui. No tempo de Jorge Gonçalves como presidente. Havia ordenados em atraso, podia ter rescindido e tive uma proposta concreta de Pinto da Costa.
- E o que disse ao presidente portista?
- Agradeci, mas entendi que seria uma traição, ainda para mais num momento de fragilidade do clube.
- Moutinho agiu de maneira diferente...
- As circunstâncias eram completamente diferentes e não nos podemos esquecer que o Sporting recebeu onze milhões de euros.
PERFIL
Oceano Andrade da Cruz nasceu a 29 de Julho de 1962 (48 anos), em São Vicente (Cabo Verde). Enquanto futebolista actuou a médio e defesa-central e passou por diversas equipas: Almada (1978-1980); Nacional (1980--1982); Sporting (1982-1990 e 1994-1998); Real Sociedad (1990-1994) e Toulouse (1998--1999). Foi internacional sub-21 (4 jogos) e pela selecção principal (54 jogos, 8 golos). Depois da carreira como jogador, estreou-se como técnico na Selecção Nacional de sub--21, onde não conseguiu qualificar a equipa portuguesa para a fase final do Campeonato da Europa.
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