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Formação. O Sporting tem vistas curtas para os olheiros PDF Versão para impressão Enviar por E-mail
Sábado, 25 Junho 2011 12:02

110625_olheirosComo estão a ser afastados os observadores que criaram o mito da formação leonina

 

Rui Patrício, provavelmente o jogador mais valioso do actual plantel do Sporting e neste defeso falado para o Manchester United podia estar hoje no Benfica se a prospecção do clube de Alvalade não tivesse funcionado como era costume: melhor que a dos rivais. Patrício tinha apenas onze anos quando Artur Garrett foi ver um jogo do Marrazes, à procura de outro miúdo, mas foi o guarda-redes que o surpreendeu

. Veja a urgência do processo iniciado: "As qualidades eram evidentes. Durante o jogo telefonei logo ao Aurélio Pereira a dizer que era para assinar contrato; o Aurélio entrou imediatamente em contacto com o presidente do Marrazes, para antecipar e marcar a posição do Sporting face à concorrência; no final do jogo pude abordar o treinador do Rui Patrício e recolher mais informações dizendo que o Sporting já estava em contacto com o clube; depois falámos com a família; quando o Benfica entrou em cena a transferência já estava assegurada." O sucesso no caso de Rui Patrício foi garantido pela "confiança" entre Artur Garrett e Aurélio Pereira, mas essa relação degradou-se nos últimos dois anos, depois da reorganização dos métodos de recrutamento na Academia de Alcochete. Os observadores mais experientes da casa começaram a perder influência e deu-se aquilo que Artur Garrett chama uma "inversão de competências". "Já agora, nunca quis dizer que fui eu que descobri o Rui Patrício, só aceito contar esta história para acabar com alguns protagonismos bacocos que têm aparecido na imprensa", adianta ainda Garrett.

Os caçadores de talentos mais antigos do Sporting, aqueles que ajudaram a dar reputação à mais elogiada prospecção do futebol português, estão descontentes e Artur Garrett é apenas um deles. José Santos e João Ruas são outros dois. A reportagem do i encontra-os no Parque das Nações. À nossa frente estão olheiros com 25, 20 e 15 anos de trabalho no clube, observadores que descobriram jogadores como Rui Patrício, Hugo Viana ou Silvestre Varela. "Mas não queremos aqui mostrar currículo, há muita gente que gosta de se pôr em bicos de pés, mas para nós quem descobriu os jogadores sempre foi o departamento de prospecção do Sporting, chefiado por Aurélio Pereira, a quem sempre reconhecemos a liderança e admiração, por comandar um grupo forte e unido. O que nos preocupa é o estado a que o recrutamento chegou, espelhado na fraca qualidade das equipas." Pela primeira vez, esta época o Sporting não produziu qualquer equipa campeã nacional em nenhum escalão. Esta pré-temporada serão chamados jogadores da formação ao estágio da equipa principal, orientado por Domingos Paciência, mas à medida que se desce nas idades o panorama vai sendo mais desolador, especialmente a partir dos sub-16, uma geração já da responsabilidade da prospecção do núcleo que Sporting tem no Estádio Universitário, sob as novas directrizes entretanto implementadas. A evidência reflecte-se nos internacionais chamados às selecções, que são cada vez menos. Porquê? Veja o que mudou. "Vamos ver um jogador, fazemos um relatório, esse documento é inserido num computador, depois um dia alguém irá observar o miúdo novamente... uns meses depois toma-se a decisão... Porque é que deixaram de nos ouvir?", questionam Garrett, Santos e Ruas. A pergunta fica em cima da mesa, mas as histórias rolam. Nélson Oliveira, avançado chamado por Jorge Jesus à pré-temporada do Benfica e provavelmente a maior pérola da formação encarnada podia ser jogador do Sporting, mas alguém se distraiu. "Quando ainda jogava em Braga, em Outubro, o Sporting tinha em sua posse um relatório meu, mas só em Abril alguém foi fazer a observação decisiva; e mesmo aí acharam que não era um jogador assim tão bom. Já estava a caminho do Benfica...", conta José Santos.

Artur Garrett, José Santos e João Ruas ajudaram a montar a teia de observadores que o Sporting espalhou pelo país. O primeiro jogou no Sporting (chegou a ser colega de Jorge Jesus nos juniores) e depois de se reformar da carreira de bancário concentrou-se na observação de jovens futebolistas. É o sócio 6690, o único olheiro ainda no clube daqueles que começaram a trabalhar com Aurélio Pereira. José Santos, coronel na reserva, juntou-se à equipa uns anos depois e é igualmente sócio do clube, tal como João Ruas (filho de Libânio, ex-guarda--redes), que também fez percurso de jogador (na formação leonina) e de treinador. "No início éramos apenas sete ou oito a fazer prospecção, íamos a todo o lado, mas a partir daí estabeleceu-se uma rede de contactos que chegava sempre em primeiro lugar, fosse onde fosse." Aurélio Pereira, o chefe, tornou-se a face do sucesso à medida que o Sporting vendia os jogadores que formava, mas hoje percebe-se o descontentamento, com ele e com Pedro Mil Homens, o último homem forte da Academia de Alcochete, entretanto já afastado pela nova direcção. Atrás de Mil Homens podem ir outros da sua confiança. Tudo está em causa e isso percebeu-se a partir de Outubro do ano passado, quanto Bento Valente deu uma entrevista arrasadora à "Academia de Talentos": o último braço-direito de Aurélio Pereira apresentou a demissão criticando toda a estrutura e denunciando a perda de autoridade de um homem a que chama "mito", por ter sido ele a arrecadar os louros de caçador de talentos. E assim começou a cair por terra a credibilidade do departamento mais elogiado no clube nas últimas décadas.

FUTEBOL de gabinete O Sporting tem hoje uma rede de 150 olheiros espalhada pelo país. Artur Garrett, José Santos e João Ruas ocuparam posições de relevo mas passaram nos últimos anos de "coordenadores de zona" para algo que passou a designar-se "observadores especiais", um nome pomposo que não esconde uma despromoção. "Supostamente devíamos ter capacidade de decisão na escolhe de jogadores, mas perdemos influência." Na última época o cenário piorou e acabaram equiparados aos "observadores residentes", como aqueles que estão em início de carreira. "É como se me estivessem agora a ensinar como se observa um jogador para o Sporting", diz Garrett. "Somos incómodos, questionamos a razão de o Sporting ter batido no fundo e então estamos a ser afastados", concordam depois. Nos seus lugares e em toda a estrutura foram progressivamente lançados elementos da confiança de quem manda, designados no meio com a generalização de "professores". "Uma estagiária poderá decidir sobre um relatório de um jogador feito por um observador experimentado? Isto aconteceu no Sporting. Hoje, no clube, acredita-se que se descobre um jogador sentado atrás de um computador, mas não é assim", diz Artur Garrett.

No meio da conversa, os três olheiros vão lançando nomes de jovens craques que os impressionaram nos últimos tempos, mas sabem que a sua opinião já não é tida em conta da mesma forma. A notícia de que Luís Duque será o novo patrão da academia do Sporting agrada-lhes, mas estão à espera de perceber até onde chegam as mudanças. E nem lhes interessa estas lhes digam respeito apenas a eles próprios, porque afinal são reformados, têm a vida feita e aquilo que o clube lhes paga é pouco mais que os quilómetros em deslocações. "Os antigos trabalham com paixão, outros é com dinheiro", avisa José Santos. "A nossa satisfação é ver os jogadores chegarem à equipa principal e às selecções. Somos sócios do Sporting, gostamos e queremos ganhar, mas interessava perceber se muitos dos que lá trabalham são pelo menos adeptos do clube... Aliás, nem nos importávamos que acabasse o pouco dinheiro que existe. Assim logo se via quem lá ficava por vocação! A chegada do Luís Duque poderá ser positiva, assim ele consiga ouvir as pessoas certas, não apenas os que estão nos gabinetes mas também os que andam atrás das árvores a descobrir jogadores, ao frio e à chuva".

Um dos casos mais surpreendentes dos últimos tempos foi a contratação de Bruno Maruta, responsável da formação do Benfica que dois anos depois de entrar em Alcochete regressou à Luz. "Foi um fiasco, delineou uma estratégia mas nunca a aplicou e depois nem sequer quis discuti-la." Ao mesmo tempo que o recrutamento no país sofreu "desinvestimento" e "perdeu hegemonia face aos rivais", o Sporting passou a recrutar no estrangeiro, numa política sem impacto no plantel principal. "Gastaram-se milhões. O Sporting tem de voltar a recrutar bem dentro do país", insistem. "É preciso capacidade para detectar, competência para seleccionar e agilidade a contratar", explica Artur Garrett. "Isto perdeu-se tudo no Sporting. O que se fez em 30 anos destruiu-se em dois ou três", conclui João Ruas. "E não estamos aqui a dizer que somos infalíveis. É muito difícil acertar num jogador, sabemos que só alguns podem chegar ao topo, mas acreditamos que é com experiência que se falha menos vezes".

"Mas há mais. Sabia que o Sporting tem miúdos à mercê de empresários, mesmo em idades a rondar os oito e nove anos? Acho pouco ético e nada pedagógico", denuncia Garrett. A formação do Sporting está em causa. Na próxima época há pelo menos uma tentativa de fazer o sportinguismo regressar à Academia de Alcochete e nomes como Sá Pinto ou Vidigal estarão de regresso. Mas Luís Duque ainda toma decisões.

 

In ionline.pt


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